31 dezembro 2005

imposições

vou pensando na vida. nada acontece como se espera.
tentando aceitar que o controlo não nos pertence.
vejo para além de mim e apercebo-me que não sou única.
numa desligação de seres e inconstâncias, aqui vou eu..
ah, precisar de um pouco mais de calma e lucidez..
tento aceitar o que sobre mim é imposto..
decisões para tomar, todas demasiado confusas.
continuo sem saber para onde ir, que rumo tomar..
tenho verdades dentro de mim desconhecidas..
sentimentos inteligíveis e mentiras em demasia..
as fotos a preto e branco no quarto lembram-me de momentos..
dia a dia, carpe diem, é difícil.
ter que cortar amarras com vícios e hábitos erráticos.
dizer adeus para não sofrer e poder ir seguir.
viagens para fora da terra, quem dera.
um ano num lugar deserto, perdido de civilização.
sei do que é preciso, que não posso.
no que se pode, não vou mexendo nem mudando.
perder-se em amizades de que por vezes se duvida,
carinhos que parecem impostos e caras conhecidas.
poder ligar com alguém,
contar o que verdadeiramente se pensa e sente,
perder-se em palavras sem resguardos nem cautelas.
um alguém não sabe que o desejam, mas assim é exigido.
para que pelo menos as circunstâncias se mantenham imunes.
alter-se o pensamento sobre os dias em que caminhamos.
hoje vem-se as árvores, ouvem-se os rumores naturais.
um sorriso, um grito de revolta e frustração, um choro perdido.
se pudesse alguém imaginar sequer quais são todos os conflitos..
por muito que deles fale, ninguém os explica.
por muito que neles se pense, ria ou chore, não se afastam.
os postais de cor plena e supérflua, os cheiros doces,
a radiofonia e o barulho dos carros na rua..
tudo nos enche e faz sucumbir.. não dever..
mais uma vez levanta-se a cabeça,
dispostos a fazer e aceitar, sem controlo.

06 dezembro 2005

Charlatão vivia num mundo de manhas. Não sabia o que eram sentimentos nem verdades. Não tinha como perceber os desentendimentos da vida. Padecia de uma forte solidão enquanto rodeado de pequenas multidões inventadas. Enganava-se mentindo sobre todas as existências que conhecia, acrescentando pontos e vírgulas a histórias já de si mirabolantes. Nada conhecia para além do pequeno quadrado em que sempre vivera. De cores garridas revestia a sua ausência de vida e vivia nos dias célere com medo da morte. Perdeu-se uma vez no centro das suas esquinas e nunca mais encontrou o parafuso que lhe dava discernimento. Bebia demais, zurrava demais, destruía-se demais. Num consumo frenético de prazeres que não tinha.

por vezes este charlatão transforma-se, tomando formas reais como a minha, a tua ou a de ninguém..
por vezes o charlatão salta do seu desentendimento afogueante e cirandeia pelas vielas procurando algo mais que às coisas dê sentido..
por vezes o charlatão perde-se e esquece quem foi..
por vezes o charlatão bate com a cara no chão para depois dormir um sono inquieto..
por vezes o charlatão desaparece..
por vezes o charlatão quer ser mais que o seu mero ser..
por vezes o charlatão tem razão em querer sonhar..